filosofia (30/07/08)
Senso comum e bom senso
Chamamos de senso comum ao conhecimento adquirido pela tradição, e ao qual acrescentamos o resultado da experiência vivida na coletividade a que pertencemos. Trata-se de um conjunto de idéias que nos permite interpretar a realidade, bem como de um corpo de valores que nos ajuda a avaliar, julgar e, portanto, agir.
O senso comum não é refletido e se encontra misturado de crenças e preconceitos. Com isso não queremos desmerecer a forma de pensar do homem comum, mas apenas enfatizar que o primeiro estádio do conhecimento precisa ser superado em direção a uma abordagem crítica e coerente. Em outras palavras, o senso comum precisa ser transformado em bom senso.
Qualquer pessoa, não sendo vítima de doutrinação e dominação, e se for estimulada na capacidade de compreender e criticar, torna-se capaz de juízos sábios porque vitais, isto é, orientados para sua humanização.
Geralmente os obstáculos à passagem do senso comum ao bom senso resultam da exclusão do indivíduo de decisões importantes na comunidade em que se vive.
Mesmo aqueles que freqüentam escolas submetem-se a perversa divisão em que, para alguns, é reservada a formação humanística e científica, enquanto outros recebem apenas preparação técnica, mantendo-se a dicotomia trabalho intelectual / trabalho manual. Com isso, é garantida a dominação daqueles que são obrigados a se ocupar apenas com o fazer.
No entanto, não são apenas trabalhadores manuais que não tem passar do senso comum para o bom senso. De empresários a cientistas podem estar restritos do senso comum quando se acham presos a preconceitos, a concepções rígidas, quando sucumbem à ação massificante dos meios de comunicação em massa (TV, rádio...)
Outras vezes, renunciamos ao exercício do bom senso quando nos submetemos ao poder dos tecnocratas, seduzidos pelo “saber do especialista”. Basta observar a timidez de decisão dos pais que, ao educar os filhos, delegam poderes a psicólogos, pedagogos. Não pretendo desvalorizar a contribuição da ciência com isso, pelo contrário! Apenas ressaltamos que o homem leigo não precisa permanecer passivo diante do saber do técnico, demitindo-se das ações que ele próprio poderia exercer. Em última análise, convém desmistificar a tendência de cultuar as pessoas “estudadas” em detrimento dos homens “sem letras” ou simplesmente não especialista.
Qualquer homem, se não foi ferido em sua liberdade e dignidade, e se teve ocasião de desenvolver a habilidade crítica, será capaz da autoconsciência, de elaborar criticamente o próprio pensamento e de analisar adequadamente a situação em que se vive.
IDEOLOGIA
A ideologia é apresentada como tendo fundamentalmente as seguintes características:
= constitui um corpo sistemático de representações que nos “ensinam” a pensar e de normas que nos “ensinam” a agir;
= tem como função assegurar determinada relação dos homens entre si e com suas condições de existência, adaptando os indivíduos às tarefas prefixadas pela sociedade;
= para tanto, as diferenças de classe e os conflitos sociais são camuflados, ora com a descrição da “sociedade uma e harmônica”, ora com a justificação das diferenças existentes;
= com isso é assegurada a coesão dos homens e a aceitação sem críticas das tarefas mais penosas e pouco recompensadoras, em nome da “vontade de Deus” ou o “dever moral” ou simplesmente como decorrente da “ordem natural das coisas”.
= em última instância, tem a função de manter a dominação de ma classe sobre a outra.
Portanto, a ideologia se caracteriza pela naturalização, na medida em que são consideradas naturais as situações que na verdade são produtos de uma ação humana e que portanto são históricos e não naturais: por exemplo, dizer que a divisão da sociedade em ricos e pobres faz parte da natureza; ou que é natural que uns mandem e outros obedeçam.
A afirmação “a educação é um direito de todos” é verdadeira e até um dever, já que há obrigatoriedade legal de se completar o curso primário. Mas essa afirmação se torna abstrata e lacunar ao apresentar como universal um valor que apenas beneficia uma classe.
Isso é confirmado pelas estatísticas que mostram a evasão escolar por partes das classes desfavorecidas. Mesmo que sejam dadas “explicações”, em função das dificuldades de adaptação, do mercado de trabalho e até do desinteresse ou preguiça dos alunos, o que se oculta é que na sociedade de classes há uma contradição entre os que produzem a riqueza material com seu trabalho e os que usufruem essas riquezas, excluindo delas os produtores. Assim, a educação é um dos bens a serem usufruídos pelos componentes da classe dominante.
Com isso não desconsideramos as diferenças que de fato existem ente os indivíduos, mas, grosso modo, na ideologia a atividade a que cada um se submete aparece como decorrente da competência e não como resultado da divisão de classes.
Assim, se o filho de um operário não melhora o padrão de vida, isso é explicado como resultado de sua incompetência, falta de força de vontade ou disciplina de trabalho, quando na realidade ele joga um “jogo de cartas marcadas”, e suas chances de melhorar não dependem dele, mas da classe que detém os meios de produção.
A ESCOLA
Segundo Althusser, o Estado tem um aparelho repressivo (exército, polícia, prisões, etc.) que assegura a dominação pela violência que assegura a dominação pela violência, mas também se utiliza de outras instituições pertencentes a sociedade civil (a família, a escola, a igreja, os meios de comunicação, etc.) a fim de estabelecer o consenso pela ideologia. E que porisso são chamados de aparelhos ideológicos do estado.
O próprio funcionamento da escola repete a estrutura hierarquizada reproduzindo muitas vezes as relações autoritárias existentes fora dela. E, mais ainda, acentuando a dicotomia entre a teoria e a práxis, a escola não só desvaloriza o trabalho manual privilegiando o trabalho intelectual como também torna a própria teoria estéril, já que distanciada da prática freqüentemente simples erudição inútil.
Portanto, para esses teóricos a escola não democratiza, mas, ao contrário, reproduz a divisão social e mantém os privilégios de classe.
(ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando – Introdução a Filosofia, ed. Moderna, 1993.)
Chamamos de senso comum ao conhecimento adquirido pela tradição, e ao qual acrescentamos o resultado da experiência vivida na coletividade a que pertencemos. Trata-se de um conjunto de idéias que nos permite interpretar a realidade, bem como de um corpo de valores que nos ajuda a avaliar, julgar e, portanto, agir.
O senso comum não é refletido e se encontra misturado de crenças e preconceitos. Com isso não queremos desmerecer a forma de pensar do homem comum, mas apenas enfatizar que o primeiro estádio do conhecimento precisa ser superado em direção a uma abordagem crítica e coerente. Em outras palavras, o senso comum precisa ser transformado em bom senso.
Qualquer pessoa, não sendo vítima de doutrinação e dominação, e se for estimulada na capacidade de compreender e criticar, torna-se capaz de juízos sábios porque vitais, isto é, orientados para sua humanização.
Geralmente os obstáculos à passagem do senso comum ao bom senso resultam da exclusão do indivíduo de decisões importantes na comunidade em que se vive.
Mesmo aqueles que freqüentam escolas submetem-se a perversa divisão em que, para alguns, é reservada a formação humanística e científica, enquanto outros recebem apenas preparação técnica, mantendo-se a dicotomia trabalho intelectual / trabalho manual. Com isso, é garantida a dominação daqueles que são obrigados a se ocupar apenas com o fazer.
No entanto, não são apenas trabalhadores manuais que não tem passar do senso comum para o bom senso. De empresários a cientistas podem estar restritos do senso comum quando se acham presos a preconceitos, a concepções rígidas, quando sucumbem à ação massificante dos meios de comunicação em massa (TV, rádio...)
Outras vezes, renunciamos ao exercício do bom senso quando nos submetemos ao poder dos tecnocratas, seduzidos pelo “saber do especialista”. Basta observar a timidez de decisão dos pais que, ao educar os filhos, delegam poderes a psicólogos, pedagogos. Não pretendo desvalorizar a contribuição da ciência com isso, pelo contrário! Apenas ressaltamos que o homem leigo não precisa permanecer passivo diante do saber do técnico, demitindo-se das ações que ele próprio poderia exercer. Em última análise, convém desmistificar a tendência de cultuar as pessoas “estudadas” em detrimento dos homens “sem letras” ou simplesmente não especialista.
Qualquer homem, se não foi ferido em sua liberdade e dignidade, e se teve ocasião de desenvolver a habilidade crítica, será capaz da autoconsciência, de elaborar criticamente o próprio pensamento e de analisar adequadamente a situação em que se vive.
IDEOLOGIA
A ideologia é apresentada como tendo fundamentalmente as seguintes características:
= constitui um corpo sistemático de representações que nos “ensinam” a pensar e de normas que nos “ensinam” a agir;
= tem como função assegurar determinada relação dos homens entre si e com suas condições de existência, adaptando os indivíduos às tarefas prefixadas pela sociedade;
= para tanto, as diferenças de classe e os conflitos sociais são camuflados, ora com a descrição da “sociedade uma e harmônica”, ora com a justificação das diferenças existentes;
= com isso é assegurada a coesão dos homens e a aceitação sem críticas das tarefas mais penosas e pouco recompensadoras, em nome da “vontade de Deus” ou o “dever moral” ou simplesmente como decorrente da “ordem natural das coisas”.
= em última instância, tem a função de manter a dominação de ma classe sobre a outra.
Portanto, a ideologia se caracteriza pela naturalização, na medida em que são consideradas naturais as situações que na verdade são produtos de uma ação humana e que portanto são históricos e não naturais: por exemplo, dizer que a divisão da sociedade em ricos e pobres faz parte da natureza; ou que é natural que uns mandem e outros obedeçam.
A afirmação “a educação é um direito de todos” é verdadeira e até um dever, já que há obrigatoriedade legal de se completar o curso primário. Mas essa afirmação se torna abstrata e lacunar ao apresentar como universal um valor que apenas beneficia uma classe.
Isso é confirmado pelas estatísticas que mostram a evasão escolar por partes das classes desfavorecidas. Mesmo que sejam dadas “explicações”, em função das dificuldades de adaptação, do mercado de trabalho e até do desinteresse ou preguiça dos alunos, o que se oculta é que na sociedade de classes há uma contradição entre os que produzem a riqueza material com seu trabalho e os que usufruem essas riquezas, excluindo delas os produtores. Assim, a educação é um dos bens a serem usufruídos pelos componentes da classe dominante.
Com isso não desconsideramos as diferenças que de fato existem ente os indivíduos, mas, grosso modo, na ideologia a atividade a que cada um se submete aparece como decorrente da competência e não como resultado da divisão de classes.
Assim, se o filho de um operário não melhora o padrão de vida, isso é explicado como resultado de sua incompetência, falta de força de vontade ou disciplina de trabalho, quando na realidade ele joga um “jogo de cartas marcadas”, e suas chances de melhorar não dependem dele, mas da classe que detém os meios de produção.
A ESCOLA
Segundo Althusser, o Estado tem um aparelho repressivo (exército, polícia, prisões, etc.) que assegura a dominação pela violência que assegura a dominação pela violência, mas também se utiliza de outras instituições pertencentes a sociedade civil (a família, a escola, a igreja, os meios de comunicação, etc.) a fim de estabelecer o consenso pela ideologia. E que porisso são chamados de aparelhos ideológicos do estado.
O próprio funcionamento da escola repete a estrutura hierarquizada reproduzindo muitas vezes as relações autoritárias existentes fora dela. E, mais ainda, acentuando a dicotomia entre a teoria e a práxis, a escola não só desvaloriza o trabalho manual privilegiando o trabalho intelectual como também torna a própria teoria estéril, já que distanciada da prática freqüentemente simples erudição inútil.
Portanto, para esses teóricos a escola não democratiza, mas, ao contrário, reproduz a divisão social e mantém os privilégios de classe.
(ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando – Introdução a Filosofia, ed. Moderna, 1993.)